A Prefeitura de Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, decidiu proibir a circulação de trens entre 6h e 22h a partir do dia 14 de novembro. O decreto 43.009, assinado pelo prefeito Vittorio Medioli (sem partido), permite a circulação de locomotivas apenas no período noturno (entre 22h e 6h). A VLI, responsável pelo trecho de 37 km na cidade, disse que a medida é ilegal e que não compete ao município legislar sobre a circulação de suas composições.
A prefeitura argumenta que a VLI não cumpriu com medidas de segurança nos pontos em que a linha férrea corta áreas densamente povoadas, e que a realização do transporte de cargas bloqueia o trânsito em momentos cruciais, prejudicando a coletividade. Segundo a administração municipal, a empresa deveria ter investido cerca de R$130 milhões em obras na cidade. Em junho, Medioli havia ameaçado limitar a circulação de trens na cidade, durante a Comissão de Inquérito Parlamentar (CPI), aberta na Câmara Municipal, que tratava de apurar possíveis omissões em acidentes no trecho administrado pela da empresa na cidade.
No decreto, a prefeitura diz que ‘propôs à empresa uma solução amigável, na qual o Município executaria as soluções integradas’. Essas soluções integradas fazem parte de um conjunto de obras e de sinalizações em passagens de nível consideradas críticas na cidade.
A Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), concessionária do serviço ferroviário de cargas e controlada pela VLI, informou, por meio de nota, que considera a medida da prefeitura inconstitucional, já que a mesma não tem competência para legislar sobre trânsito e transporte de cargas.
A companhia diz, ainda, que as intervenções em Betim faziam parte de um acordo com o governo federal, de 2013, mas que foi substituído depois de um acordo judicial feito com o Ministério Público Federal (MPF), a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).
A VLI realiza regularmente os pagamentos referentes a esse acordo, mas não tem autonomia sobre a destinação do recurso. A alocação dele é definida pelo poder público federal. O Governo Federal, por sua vez, decidiu direcionar os recursos para a ampliação do metrô em Belo Horizonte.
Veja na íntegra o decreto que limita o trânsito de locomotivas em Betim (Órgão Oficial, nº 2265 30/10/2021 – PDF).
Nota da FCA na íntegra:
A Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), concessionária do serviço ferroviário de cargas e controlada pela VLI, entende que o Decreto 43.009/2021 do município de Betim é inconstitucional, em razão da competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte, conforme o artigo 22, inciso XI, da Constituição Federal, bem como de acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF), que já se manifestou sobre essa questão em uma decisão com repercussão geral. Ou seja, válida para todos os processos semelhantes.
Além disso, o parágrafo único do artigo 22 da Carta Magna autoriza apenas o estado, e não ao município, a legislar por meio de lei complementar sobre questões específicas relacionadas a trânsito e transporte. A limitação do tráfego ferroviário, com restrições de horário, velocidade e quantidade no município interfere na prestação desse serviço em outras localidades pelas quais passa a ferrovia, tendo em vista a ausência de rota alternativa. Vê-se, portanto, que a legislação do município produz efeitos que transcendem o interesse meramente local, atingindo demais entes da federação.
O município de Betim não possui competência para legislar sobre o transporte ferroviário, o qual é regido por lei federal, premissa importante para que se entenda a natureza e os limites da atividade regulatória no setor ferroviário nacional, motivo pelo qual a FCA pretende adotar as medidas judiciais cabíveis contra o referido decreto.
A companhia esclarece ainda que sua operação se dá em conformidade com todas as regras de segurança estabelecidas pelos órgãos reguladores, o que inclui, por exemplo, a circulação de trens em velocidade reduzida em perímetros urbanos e o acionamento de sinais sonoros no cruzamento com trechos rodoviários. Os sinais são utilizados dentro dos limites estabelecidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas. Adicionalmente, a companhia realiza campanhas periódicas de segurança, para orientar pedestres, ciclistas e motoristas a respeitar a sinalização, minimizando a possibilidade de ocorrências. A empresa informa, ainda, que está sempre aberta ao diálogo.
A respeito das solicitações de obras em Betim, a VLI esclarece que tais intervenções integravam uma proposta do governo federal em 2013 para converter um compromisso financeiro da empresa com a União para melhorias em algumas localidades ao longo de sua malha. O compromisso de investimentos em obras foi substituído por pagamentos em função de um acordo judicial do qual participaram o MPF, a ANTT e o DNIT, além da FCA. A companhia realiza regularmente os pagamentos referentes a esse acordo, mas não tem autonomia sobre a destinação do recurso. A alocação dele é definida pelo poder público federal.